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A REVISTA DAS BEATS

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A camisa que conectou The Town e o Setembro Negro

Atualizado: 11 de set. de 2023

Minha irmã nasceu 7 anos depois de mim. Fomos criadas em um apartamento pequeno pelos mesmos pais no saudoso bairro de Santa Tereza, em Belo Horizonte. Só uma pequena escrivaninha separava nossas camas num quarto compartilhado na infância. Já as nossas mentes sempre foram distanciadas por três mundos.



Se ela dançava ballet e tinha coleção de esmaltes para unha, eu fraturava meus ossos em aventuras de skate e cortava meu cabelo moicano para exibir as orelhas alargadas. Os poucos CDs que ela teve era de uma artista da Disney que estava as capas com um sorriso de quem dá bom dia para o chefe.



Das minhas paixões, música sempre foi uma das maiores. Entre visitas a diversos gêneros e fases, foi o rock que me tirou um sorriso mais sincero. Mais especificamente o metal. A dissonância dos riffs com as notas sequenciadas de caixa-bumbo sempre acalmaram minha mente sempre muito mais ruidosa do que qualquer álbum julgado mais pesado.


Aos 28 anos, minha irmã deixou Belo Horizonte por um feriado para ouvir Maroon 5 em São Paulo. A banda que se apresenta com mais de outros 40 artistas no festival The Town, que marca sua primeira edição neste ano. Uma espécie de Rock in Rio paulistano, que, assim como a edição carioca, abre o palco para bandas que conquistaram grande sucesso comercial.


Não estou aqui para julgar a indústria mainstream da música. Muito ao contrário. Sempre terão meu respeito os artistas - seja de qual gênero - que conquistaram a posição de poder viver de música aos gritos de milhões de fãs. Nem mesmo faço pouco caso de um evento que movimenta milhões na indústria do entretenimento que ainda vem curado suas cicatrizes pós-pandemia.



Assim como minha irmã, dediquei meu feriado para um grande festival de música. Nada de “The Town”. Ao longo de quatro dias, vi o entra e sai de mais de 30 bandas no “Setembro Negro”. Thrash, crossover, doom e death metal são alguns dos gêneros que ocupam o palco em quatro dias de evento.



Apesar da importância do festival para a comunidade headbanger, o “Setembro Negro” mal vibra a balança quando disputa o peso que o “The Town” ganhou na grande mídia, mesmo somando 15 anos de história, contra o estreante que esgotou seus ingressos para tomar o autódromo de Interlagos.



Não estou questionando o óbvio da indústria do entretenimento. No entanto, me parece inevitável uma ponta de comparação. Enquanto o “The Town” vem convertido sua notoriedade em insatisfação do público quanto aos direitos básicos de ir e vir no festival, beber água e ouvir o som dos artistas que se apresentam no palco, a organização do “Setembro Negro” vem sido abraçada pela comunidade dos camisa preta que nos faz querer morar no evento desde a sua festa inaugural até seu encerramento que acontece daqui a poucas horas do momento que escrevo este texto.



O banheiro não tinha fila, nem mesmo a fila da cerveja te tomava mais do que uma introdução de uma música. A entrada parecia um portal de boas-vindas com uma rua ocupada por metaleiros que exibiam suas bandas favoritas no peito. Se me afastei ou colei no palco, o som mostrava nos detalhes cada coladinha dos baixos na bateria.



A estética sombria dos fãs em nada reflete a energia de estar em um evento de metal. A aparência trevosa talvez seja apenas uma estratégia para espantar conversas de gente que pouco tem a dizer. As expressões nervosas logo se convertiam em sorrisos gostosos que anteviam um abraço apertado entre amigos que se reviam entre um show e outro. Talvez eu estivesse procurando quem era a avó de todos nós ali que estaria nos recebendo para um grande encontro de família.



Os artistas desciam do palco para descobrir junto com o público qual era o próximo som escolhido por uma curadoria que entregou nomes que já ocupam nossa playlist ao mesmo tempo que nos apresentou bandas ainda inéditas para boa parte de quem compareceu. Fãs se arqueavam na grade para conquistar uma palheta ou gritar mais alto o refrão da próxima música.



Meu almoço de sábado foi com a minha irmã e seus amigos. Enquanto aguardávamos as 28 mesas na nossa frente para um restaurante escolhido pela turma dela, eu os ouvia tramar planos sobre como chegar, como ficar e como sair do “The Town”. Era dia de Foo Fighters, mas eles não pareciam muito otimistas quanto à possibilidade de minimamente ouvir ou ver bem o show no festival.


Quando finalmente o restaurante anunciou nossa vez, meu tempo já havia estourado o limite. Queria chegar cedo ao “Setembro Negro” para ouvir Test, uma das bandas que mais ampliam meu espectro de emoções atualmente. Eles me desejaram boa sorte para encarar um ambiente que talvez eles acreditem que seja apenas rodas punk e gritos guturais.



Por R$25, almocei um delicioso hambúrguer de lentilha que me foi servido pela segunda vez em uma barraca do festival. Assisti ao show ancorada na grade. Não houve perrengue. Nada de empurra-empurra. Até o produtor exibiu seu repertório de variações de pedidos de desculpas para gentilmente me explicar que a área que eu havia escolhido para aguardar o início da próxima apresentação ainda não estava liberada, logo, eu precisaria me retirar por uns minutos.



Nesta madrugada para domingo, acordo insone após dormir mais cedo na noite anterior. Enquanto eu me decidia se alocava meus esforços em voltar a dormir ou me preparar para o último dia de “Setembro Negro”, velei meu sono de vez quando vejo uma foto postada pelo Andreas Kisser, guitarrista do Sepultura, junto com o baixista Paulo Xisto. Entre os dois, Dave Grohl, vocalista do Foo Fighters, que usava a camisa do Voivod, banda que tocou quinta-feira no “Setembro Negro”.



Uma camisa que conecta os festivais e nos lembra que música é uma conexão de paixões. Não importa o porte dos eventos, as cores das roupas ou o quão harmônico soam os acordes. Este feriado marca a celebração de quatro dias em que milhares de pessoas puderam vibrar com seus artistas favoritos, no The Town ou Setembro Negro, promovendo o melhor gênero desta arte: a diversidade.



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