Nos bastidores, onde a luz dos holofotes raramente alcança, transitam os profissionais responsáveis por garantir a excelência de um show. Conhecidos por fazerem parte da "graxa", são os primeiros a chegar e os últimos a sair, com a missão de assegurar a estrutura perfeita para que o artista chegue ao palco sem se preocupar com mais nada além de impactar os fãs com seu som.
Com o Sepultura não é diferente. A banda de metal brasileira, que está completando 40 anos, divulgou este ano os shows em comemoração do aniversário junto com a notícia da sua morte anunciada. Esta será a última turnê de uma história que levou o nome do Brasil para o mundo com sua capacidade de inovação, originalidade e resistência a tantos desafios encarados.
Se as guitarras de Andreas Kisser estiveram afinadas e preparadas para segurar a porrada do som que moldou o metal nacional, temos um responsável: Dante Rozalini, guitar tech do Sepultura por quase dez anos. Nascido na capital de São Paulo, passou a infância na zona norte em uma família apaixonada por música. Seja na faxina de casa ou na Kombi com o pai que atuava como mecânico de moto, os alto-falantes estavam sempre na atividade reproduzindo de Rita Lee a Black Sabbath.
Irmão mais velho entre três filhos que escolheram a arte como profissão, Dante passou a juventude sem grandes apostas sobre o que seria quando crescesse. Aos 10 anos, pediu uma guitarra para o pai, mas o entusiasmo passou rápido e logo foi vendida. A paixão pelo instrumento voltou em um ambiente longe das figuras sombrias do universo do metal. Com 13 anos, frequentava a igreja católica com a família e lá reanimou seu interesse pela guitarra.
Ainda adolescente, assumiu como guitarrista na banda Horus Corpus, onde explorou seu talento para o rock progressivo. Mas foi durante a produção de um festival de música promovido por dois anos pela própria banda, o Arena Horus, que descobriu as diversas profissões de bastidores.
Encerrada a temporada do festival, acreditou por um instante em uma carreira longe dos palcos. Matriculou-se no curso de Nutrição e empreendeu em uma fábrica de sorvetes com sua então parceira. Não demorou muito para que a música voltasse para a sua vida, quando o recentemente falecido Paulo Cesar Lopes, conhecido como Nê, o introduziu no universo da luthieria do qual nunca mais saiu.
A atuação como roadie de cordas começou com incentivo do também guitarrista Jean Patton, ex-membro da Project 46. Amigos desde a época de escola, Dante começou vendendo camisetas nos shows da banda. Em uma oportunidade ao acaso, passou a apoiar como guitar tech de Jean e iniciar uma sua especialização na área. Até assumir a função no Sepultura, garantiu o som das guitarras em grandes nomes nacionais como Krisiun e André Matos. Mesmo que focado em atuar no metal desde o início, passou por renomados grupos de reggae e até sertanejo.
O Sepultura fez parte da sua juventude, até que em uma fase acabou deixando de ouvir com tanta frequência para conhecer novos sons. A banda voltou a fazer parte dos seus dias quando encontrou em uma banca de CDs falsificados o álbum "Dante", lançado em 2006. Curioso pela coincidência de o disco assinar seu mesmo nome pessoal, comprou a edição pirata que tocou em volume máximo por anos no seu carro Uno que tinha na época.
O que ele mal podia imaginar era que em alguns anos depois receberia um convite para ser o guitar tech de Andreas Kisser. A proposta veio do então roadie Arthur Bevilacqua que assumiu o cargo no Sepultura por um dia e acabou passando o bastão para o Dante, enquanto Arthur seguiria em turnê com a cantora finlandesa Tarja pela Europa. Aceitou o cargo com euforia e uma dose de medo. Afinal, a responsabilidade de atuar com um dos maiores nomes da guitarra mundial impunha respeito e insegurança.
Depois de quase 10 anos na função, coleciona experiências que ele considera ser a maior conquista de toda sua história. As lições aprendidas com Andreas foram além das cordas. O músico o ensinou a respeitar as diferenças de cada pessoa e a ser resiliente, apesar de eventuais adversidades.
Em uma rotina de constantes viagens, Dante comemora a harmonia entre toda equipe. Para ele, o que acontece na estrada é resolvido por lá mesmo. Nada fica mal conversado. A prática da convivência o fez aprender a catalisar a diversidade de culturas em sabedoria para vida e trabalho. "Tenho muita memória afetiva por tudo que vivi e ainda viveremos nos próximos meses juntos nesta turnê", comemora.
Em uma trajetória como roadie fazendo até 100 shows por ano, conheceu mais de 50 países. Alguns que nem ele mesmo imaginou visitar, como é o caso da Mongólia, ele brinca. A rotina fora de casa não é problema com a família. Marcia, sua mulher, além de amar metal como ele, respeita sua agenda e garante o equilíbrio para manter um relacionamento saudável. Apesar da saudade que sente da esposa, família, enteado, casa e os cachorros, aprendeu a administrar os sentimentos quando cai na estrada.
Para quem quer saber como ser roadie de cordas, Dante tem seu palpite: "não começar pelo ‘caminho Nutella’". Oferecer apoio aos amigos que têm bandas, frequentar shows e admitir que no início de carreira a remuneração é baixa mesmo. Segundo ele, normalmente os profissionais começam na área tendo a própria banda ou trabalhando para amigos. Apesar de não ter tido acesso a cursos na sua época, ele lembra que hoje já existem formações e bastante conteúdo na Internet de capacitação. Algumas características ele destaca como fundamentais para quem quer seguir na área: atenção, responsabilidade, saber inglês e ter muito amor à música.
Enquanto a história do Sepultura nos palcos tem data para acabar, Dante enxerga um longo horizonte para sua carreira profissional. Focado no momento em acompanhar Andreas até o último dia da turnê "Celebrating in Life Through Death", ele está aberto para novos convites após este ciclo e pretende investir ainda mais na sua carreira como luthier.
Para os fãs que desejam acompanhar de perto o trabalho de Dante e dos demais roadies da banda, a oportunidade de garantir um ingresso [https://www.sepultura.com.br/tour] com acesso ao sound check está disponível. As datas de shows estão se esgotando rapidamente, mas ainda há algumas localidades com disponibilidade para vivenciar os últimos acertos entre os técnicos e os músicos em um dos maiores shows de metal de todos os tempos.
Parabéns ao Dante ele é D+
Adorei o texto de vcs, mto obrigada pelo carinho com o Dante!